“Margareth tem uma perspicácia para coisas especiais.
Essa música, “Mulher de Coronel”, é especial no meu
repertório. Ela surge dos elementos básicos da minha
formação nordestina. Ela é muito especial por causa
do tema, do assunto. Embora pudesse ser considerada banal,
a incondicionalidade do amor é uma coisa muito forte.
Margareth é um dos meus amores. É isso: amor é amor, é
incondicional! Dela eu gosto e vou gostar até morrer.” Gilberto Gil
Há quem diga que o seu canto é uma força da natureza. E quem já a viu em cima de um trio há de concordar. Parece uma guerreira de luz. Representante da cultura popular brasileira, gravou seu primeiro disco em 1988. De lá prá cá, sua carreira foi pontuada por vários trabalhos e grandes conquistas. A voz possante da baiana rasgou fronteiras, ganhou o mundo. Com o norte-americano David Byrne, colocou o pé na estrada e se apresentou pela Europa e pelos Estados Unidos no final da década de 1980. Começava aí o sucesso, também internacional.“Luz Dourada” vendeu mais de 2 mil cópias em apenas dois meses de lançamento na Suíça, e “Kindala” já ultrapassou as 10 mil cópias na França. A boa receptividade não se restringe à vendagem. “Elegibô” é considerado um dos cinco melhores discos do planeta na categoria world music, segundo a revista Rolling Stone. Na Itália, numa prova de popularidade que dispensa comentários, a cantora foi convidada especial do programa Tombola, um dos mais famosos da Radio Televisione Della Svizerra, com transmissão ao vivo para toda Itália e Suíça.Da infância na Ribeira, bairro pobre de Salvador, Margareth Menezes subiu aos palcos dos quatro cantos do planeta, conquistou fama, dinheiro e é uma estrela em ascensão. Do muito que ganhou, reparte o pão. Criou o projeto “Fábrica Cultural”, arte e educação para jovens carentes de Salvador.
na Península Itapagipana, onde eu nasci e
me criei. Até hoje, meus pais moram lá.
Uma baianidade genuína é o que reflete o
povo da península e isso também faz parte
da nossa ação, teremos um museu
de memória da vida de Itapagipe”.
Margareth Menezes: Acho que o fato de ser artista já é uma ação ligada à responsabilidade social. Como vivemos num país com tanta carência de oportunidades, quando chegamos ao ponto de ter algum poder de mobilização, então começamos a pensar, a apoiar e a praticar ações sociais visando a ajudar as pessoas que precisam. Também não fazemos isso para parecermos bons, e sim para dar um retorno ao nosso povo pelo carinho, pela torcida. Claro que contamos com a presença de outras pessoas que são muito importantes para que esse trabalho seja realizado. Jaqueline Azevedo e Selma Calabrik são as guerreiras que estão me ajudando a tocar esse sonho.No final do ano passado, Margareth lançou novo CD - “Naturalmente”- que traz composições de vários artistas, entre eles Arnaldo Antunes, Marisa Monte, Chico César, Zeca Baleiro e Gilberto Gil.
Revista Util: Como é isso, Margareth, reunir tantas feras neste CD? Fale um pouco desse trabalho?
Margareth Menezes: O CD “Naturalmente” está sendo muito bom para mim. Poder cantar essas músicas e exercitar todos esses sentimentos, expressões diferentes da de cantar música mais frívola, como fazemos durante o carnaval.A diferença é que o descompromisso dá lugar à atenção no "quê" e "como" estamos cantando essas coisas de amor, que pedem mais reflexões. Não adianta negar, o povo brasileiro gosta mesmo é de romance. Cantar Chico César, Nando Reis, Marisa Monte, Arnaldo Antunes, Pepeu Gomes, Zeca Baleiro, Luis Represas, enfim, é um grande sonho para mim, não estou negando nem me despedindo de nada do que eu já conquistei, mas estou me reinventando no meu ofício de cantar.Tem também uma música chamada “Matança” que é de um compositor baiano chamado Jatobá. Ele mora no Rio e essa música eu acho muito especial, pois é um verdadeiro protesto ecológico que dediquei à ex-ministra Marina Silva. Por sua luta honesta e por sua história de vida, acho que ela merece toda nossa admiração.
Margareth Menezes: “Lua no Mar” é uma composição minha e do Robson Costa. Nos meus CDs, eu sempre incluo uma ou algumas músicas minhas, e essa está muito especial, ficou com uma cara meio bossa. Na verdade, aí tem as mãos de Mazzola na proposta, e do maestro Ricado Leão nos arranjos, que deram uma elegância particular à música. Quero aproveitar também para ressaltar a importância deste maestro que tive o prazer de conhecer, um músico fantástico e grande arranjador.
Margareth Menezes: Eu adoro essa música. Cheguei a cantá-la por muito tempo nos meus shows. Quando surgiu a ideia do projeto, falei com o Mazzola sobre essa música e ele gostou.Esse laboratório pelo qual passei para cantar essas músicas foi muito interessante. Num primeiro momento, parecia distante devido a vícios que, às vezes, adquirimos quando estamos exercitando só um lado da interpretação. Eu tive que mergulhar em mim, buscar meu início de carreira, quando fazia teatro sob a orientação da professora Hebe Alves, que em duas aulas me fez resgatar essas emoções guardadas. Existe muita coisa nas entrelinhas do canto que só com estudo e exercício é que se conquista.
Margareth Menezes:A realização do artista é a atividade, a dinâmica de atuar. Já aconteceram muitas coisas ao longo da minha carreira, experiências ruins e boas, e isso nos dá uma bagagem importante para traçarmos novos rumos. Vim do teatro e do canto na noite, cantei em muitas casas de Salvador, me apresentei como atriz, também em vários palcos, por um período de sete anos. Depois que gravei a música “Faráo”, aí comecei a ser convidada para cantar em trios elétricos, mas sempre preservei o lado da pesquisa, do diferencial na sonoridade, nos temas e no jeito de cantar. O Brasil é grande, o mundo é grande, e a minha sede de cantar é enorme. "Nem que eu bebesse o mar / encheria o que eu tenho de fundo!"( Djavan). Então, ainda tenho muito pra fazer até me dizer realizada. O reconhecimento me fortalece, mas não me sacia. No Brasil, viver de arte é dar nó em pingo d'água, é atividade e sinto que ainda tenho muita coisa pra fazer.
Revista Util: Voltando lá atrás, no início de tudo, quem foi o seu grande incentivador ou mentor?
Margareth Menezes: Quem primeiro me sacou foi minha mãe, acho que pelo fato de na família dela ter meu avô José, que tocava violão, e meus tios, que faziam samba de roda. Ela ficava mais tempo com a gente, porque meu pai trabalhava, então ela tinha muita atenção para nossas manifestações. Depois, já na escola, tive uma pessoa que, realmente, foi muito importante, meu professor de teatro Reinaldo Nunes, que me esinou as coisas essenciais sobre como usar o palco, que eu trago comigo até hoje.
Revista Util: Um agradecimento especial?
Margareth Menezes: Agradeço ao Mestre Divino tudo que eu venho recebendo da vida, nas dificuldades, eu aprendo a crescer e a reconhecer o valor real de acreditar num Deus Supremo que me acolhe. Na bonança, eu quero agradecer e aprender, mais e mais, a viver melhor pra conhecer Deus. Esse é o agradecimento que eu trago em meu coração, a todo momento, agradecer por estar viva e por ter saúde, por enxergar, poder andar e poder trabalhar, e poder amar.
Revista Util: Este ano você completou 10 anos à frente do bloco “Os Mascarados”, que revitalizou o carnaval à fantasia em Salvador e, hoje, faz parte do calendário festivo da cidade e recebe turistas do mundo inteiro. Quais os planos para o bloco daqui pra frente?
Margareth Menezes: Realmente, foram 10 anos para poder estabelecer esse diferencial da fantasia no carnaval. Eu acredito muito em ciclos e agora, estou iniciando um novo movimento em minha vida, ainda não sebemos com será o próximo ano, mas eu sei que esse ano foi especial.
Revita Util: Você já gravou com Maria Bethânia, Caetano Veloso, Chitãozinho e Xororó e Ivete Sangalo. Participou do projeto Tribalistas, cantando, tocando e na parceria da música “Passe em Casa”. Cantou com Rita Lee, Titãs, Lenine, Elba Ramalho, Sandra de Sá, Hermeto Pascoal, Alcione, David Byrne, Vanessa da Mata, Milton Nascimento, Daniela Mercury, Carlinhos Brown – amigo e parceiro –, Cássia Eller, Zélia Duncan e, mais recentemente, com Gal Costa e Maria Rita, na Espanha. Com quem ainda gostaria de gravar ou dividir o palco?
Margareth Menezes: O nosso país é muito lindo e cheio de gente boa fazendo música bonita. Sinto a música como uma possibilidade de unir as pessoas. Dividir uma música é, na verdade, somar emoções, embelezar o momento e engrandecer a canção.
É preciso muito mais espaço para falar da
Margareth, ela é um livro em constante construção
A cada momento cria algo novo, realiza novos
projetos, transborda energia do seu canto.
Revista Útil: Um grande amor?
Margareth Menezes: Meu marido, minha mãe e todas as crianças do mundo.
Margareth Menezes: Uma criança, duas crianças, um bocado de crianças felizes.
Margareth Menezes: Eu sonho que as crianças sejam cada vez mas respeitadas no Brasil. Essa onda de violência sexual contra crianças e adolecentes que está circulando no nosso país é um verdadeiro pecado. E também sonho que nas novelas brasileiras tenham exemplos de famílias mais equilibradas. Nós estamos precisando resgatar o respeito familiar, tão necessário para que nossas crianças e nossos jovens se sintam mais seguros. O lugar de cada um numa família é muito importante para essa referência. É isso que eu desejo para as famílias de todo Brasil. Que Deus abençoe toda essa gente boa. Beijos, Margareth Menezes.